A história que vamos contar começa no ano de 1975 com a chegada do nosso personagem Antônio Neto, ou Neto como é conhecido, na Transamazônica (BR-230/PA), com apenas 15 anos. Neto e sua família vieram de Paraíso, no Tocantins, pois haviam ganhado um lote de terra com 100 hectares nas proximidades da cidade de Tucuruí, com o objetivo de dar início às atividades agrícolas de colonização da região.
Eles chegaram numa época em que a construção de grandes rodovias para interligar a Amazônia aos grandes centros nacionais e aos portos e, de lá, para o mundo, era uma das principais políticas do Governo Médici. Naquele tempo o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), seguia um programa de colonização da região Amazônica e, durante os anos 1974/75, fez o assentamento de várias famílias no trecho conhecido como Estrada Velha, ou quilômetro 100 da Transamazônica, região onde foi instalada a família de Neto.
Comunidade planejada na Transamazônica: Casa padrão do INCRA em Brasil Novo – Fonte: tapajosmeuestado
No entanto, com a construção da hidrelétrica de Tucuruí, que inundou o lote de sua família, eles tiveram que ser remanejados para um trecho próximo à Aldeia Parakanã, localizada entre os municípios de Novo Repartimento e Itupiranga. Chegaram lá em janeiro de 1984 para recomeçar tudo do zero, no único trecho que não estava ainda colonizado, próximo às terras indígenas. Neto conta que após passar 3 anos longe da família fazendo supletivo em Marabá, voltou para ficar próximo aos seus pais e ajudá-los na lavoura. Entre as dificuldades encontradas, ele ressalta a malária, terem de enfrentar animais selvagens como onças e sucuris, abundantes naquela época, como também a falta de escolas e ensino para as crianças da localidade. Diante dessa realidade, Neto resolveu então que mudaria aquela situação crítica.
Já formado no magistério, Neto conseguiu um contrato pelo Estado para lecionar, e vendo a necessidade de sua comunidade, que não tinha escola para as crianças, pois as mais próximas ficavam em Marabá, Cajazeiras ou Novo Repartimento, resolveu construir por conta própria a primeira escola do lugar. Apesar de ser muito humilde, para a população dali era um verdadeiro sonho. A escola chamava-se Duque de Caxias, mudando anos depois para Juscelino Kubitschek como é denominada até hoje. Com muito empenho conseguiu receber do MEC (Ministério da Educação) apoio para aquisição da merenda escolar e o pagamento dos professores, e, apesar de todos os esforços, não conseguiu apoio de mais nenhuma entidade educacional ou ONG, arcando sozinho com todos os outros desafios e necessidades.
Para marcar a inauguração da escola, Neto teve a ideia de plantar ao lado dela, uma Samaúma (Ceiba pentranda), árvore nativa de grande porte. A árvore cresceu de forma imponente e sua suntuosidade representa as dificuldades e alegrias proporcionadas pelo ensino de tantos jovens que ali aprenderam, se formaram e depois retornaram para ensinar novas crianças e recomeçar o ciclo.
Por estar localizada em área próxima à terra indígena, a escola acolheu crianças vindas das aldeias. No princípio o contato com os indígenas foi muito difícil, os próprios chefes das aldeias não queriam proximidade com os brancos por causa dos costumes e cultura bastante diferentes. Por incrível que pareça, essa integração foi possível, de forma natural, através do futebol, que aproximou as duas comunidades nas peladas improvisadas próximo à escola, e que os índios adoravam, conquistando a confiança dos caciques, que a partir dali passaram a solicitar que seus filhos pudessem ser introduzidos na sociedade e costumes dos brancos. Houve uma época em que 200 alunos chegaram a ser atendidos, sendo metade assentados e metade indígenas que eram trazidos da aldeia em um ônibus.
Passaram-se 40 anos e a Samaúma agora é acompanhada de um frondoso Pau-brasil (Caesalpinia echinata), também plantado por Neto, nas comemorações de 500 anos de descobrimento do Brasil. A imagem das imponentes árvores que emolduram a humilde escola é uma bela metáfora da garra, da força e da importância desses desbravadores da Amazônia, que enfrentam grandes dificuldades de habitar uma região longínqua.
A saga de Neto e de seus colegas professores continua na esperança de que a pavimentação da rodovia, uma realidade sonhada durante todos esses anos, traga finalmente um alento e ajude o progresso e o desenvolvimento a chegar para toda aquela região.
Antônio Neto – à direita a Escola Juscelino Kubitschek feita de Tapiri, à esquerda, ao fundo, a Rodovia Transamazônica
Glicia Favacho
Programa de Comunicação Social
rodovia Transamazônica BR-230/PA